Em tempos de fake news, a verdade dos fatos deve prevalecer
Noah Berger/UCSFOutubro de 2020 ficará gravado na história por causa do lançamento de uma espécie de atlas do cérebro humano que identifica funções neurológicas importantes do órgão que mais tem intrigado a ciência e a medicina ao longo dos séculos.
Foram cinco anos de estudos desenvolvidos por um consórcio de pesquisadores sob a liderança de Helen Bateup, neurocientista celular da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos. Para Bateup, o estudo visa entender plenamente o funcionamento do cérebro para compreender melhor a complexa rede de neurônios que comandam o organismo humano, além de avaliar como as disfunções cerebrais podem causar tantos prejuízos.
O estudo também pretende descobrir formas de melhorar o uso das inúmeras funções do cérebro e revela que, embora a informação de que utilizamos uma porção pequena do nosso intelecto não corresponda à realidade, pode haver meios de tirar maior proveito da nossa capacidade cognitiva. De acordo com a neurocientista, é preciso primeiramente estudar as funções de cada parte do cérebro para entender como trabalham em conjunto. Ou seja, os avanços recentes são importantíssimos, mas ainda pode haver muito mais a ser desvendado.
Apesar da complexidade de um órgão com cerca de 160 bilhões de células, algumas descobertas esclarecem fatos curiosos, como a nossa resistência às mudanças, tanto de atitude como de pensamento. Erica Ariano, CEO da It Business Lab e professora do Centro de Inovação e Criatividade da ESPM, destaca que a mente humana busca o tempo todo evidências que confirmem suas convicções, ao mesmo tempo que evita tudo o que as contradiz.
“Quando avaliamos nossa confiança em uma crença, é mais fácil gerar evidências de apoio a ela. Esse processo tende a ocorrer automaticamente, sem percepção consciente. Sua mente quer que tudo fique como está para poupar energia e consolidar crenças. Por isso é tão difícil mudar”, explica Ariano, que também é mentora da Inovativa Brasil.
Ela destaca que, em tempos atuais, essa forma de avaliação pode complicar a vida, já que as pessoas tendem a se unir a quem pensa igual e a “cancelar” aqueles que pensam diferente. “Podemos cair no chamado viés de confirmação, que é a tendência de lembrar, interpretar ou pesquisar informações de maneira a confirmar crenças ou hipóteses iniciais. O ideal é tentar não agir por esse impulso, pois ao identificar esse comportamento haverá mais chance de evitar cair nesse viés. É preciso estar atento às reações para aprender com elas”, afirma.
Em tempos de fake news e da busca incessante por “informações sob medida”, é preciso lembrar que o mais importante é a verdade dos fatos e não a satisfação pessoal à custa de crenças em ideologias fantasiosas. A complexidade da inteligência humana não pode se render a “achismos” ou a discursos barulhentos que negam a ciência ao mesmo tempo que dizem cultuá-la.
É necessário, mais do que nunca, usar a cabeça e não se deixar levar por pensamentos desconectados da realidade que só atendem às agendas nebulosas daqueles que tentam neutralizar o raciocínio e impor um pensamento único. Somos muito mais do que isso.
Autora
Patricia Lages é autora de cinco best-sellers sobre finanças pessoais e empreendedorismo e do blog Bolsa Blindada. É palestrante internacional e comentarista do JR Dinheiro, no Jornal da Record.
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