Ao contrário do que propõe, a linguagem neutra não é inclusiva. Isso porque, em uma primeira análise, para incluir 1,2% da população – que corresponde a pouco mais de 2,5 milhões de pessoas que se reconhecem como não binárias –, exclui mais de 43 milhões de brasileiros.
De acordo com a Associação Brasileira de Dislexia (ABD), 15% da população brasileira é disléxica – o que representa cerca de 32 milhões de pessoas – e, em consequência disso, apresenta distúrbios de aprendizado que afetam a leitura, a escrita e a soletração. Quaisquer alterações de linguagem podem representar um aumento da dificuldade no aprendizado.
Da mesma forma, a interpretação da leitura labial dos surdos, que representam 5% da população ou mais de 10,5 milhões de pessoas, fica prejudicada com a mudança em diversas palavras. Segundo estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS), até 2050, cerca de 900 milhões de pessoas no mundo poderão desenvolver surdez, ampliando o número global de prejudicados pela linguagem neutra.
Segundo dados do último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem 6,5 milhões de pessoas com deficiência visual, sendo 582 mil cegos e cerca de 6 milhões com baixa visão. Para essa população, o braile e o uso de softwares especializados são as únicas formas de leitura. Mas, se por um lado os títulos em braile já são bastante escassos, os softwares – que são mais acessíveis – se tornariam um meio mais complexo de ser compreendido. Além disso, a alfabetização de crianças cegas se torna um desafio ainda maior.
Para a professora de português Cintia Chagas, colunista da Forbes e autora de dois best-sellers sobre língua portuguesa, a linguagem neutra é um desserviço ao idioma. “Dizer boa-noite a todos e a todas é uma redundância. Dizer boa-noite a ‘todes’ é uma imbecilidade. Não tenho nenhum problema com os não binários, absolutamente nenhum, mas há que compreender a verdade”, declara Chagas, que conclui: “O dialeto exclui mais do que inclui. É uma aberração linguística. O que eles ganham com isso?”.
Em um país com um índice de analfabetismo funcional altíssimo, fica a pergunta de quem trabalha há décadas para que os brasileiros falem e escrevam melhor: o que eles ganham com isso?