A facilidade de acesso a cursos superiores no Brasil não parece ter trazido melhora na performance profissional em geral. Não encontrei nenhuma pesquisa oficial sobre o assunto, mas como essa sensação não é só minha, creio que posso fazer tal afirmação.
Dando mentoria para empreendedores – micro e pequenos – vejo que há dois grandes grupos de graduados: os que nunca conseguiram emprego em sua área e os que até conseguiram, mas foram demitidos nos últimos anos. Ambos os grupos buscam o empreendedorismo por necessidade e é aí que a coisa pega, pois, para empreender não basta ter diploma, tem que ter conhecimento de fato.
Para empreender não basta ter diploma
PixabayContratei uma diarista que a cada meia hora perguntava se estava usando o produto certo na limpeza porque não entendia os rótulos. Ela sabia ler, mas simplesmente não interpretava, por exemplo, a instrução “dilua 100 ml do produto em 1 litro de água”. Para justificar sua falta de entendimento, alegou que tinha acabado de se formar em Ciências Contábeis e que seu negócio eram números, não letras. Mas quando não conseguiu calcular seu gasto com transporte para receber o reembolso, mostrou que os números também não eram seu forte. Ela realmente tinha um diploma, não era invenção, porém, até os conhecimentos básicos passaram longe.
Situações como essa têm acontecido em diversos segmentos e com todo tipo de cargo e função. Desde o primeiro e-mail é notório que a pessoa do outro lado da tela não tem preparo para estar ali. São textos que precisam ser “decodificados” de tão mal escritos, mas embaixo do nome de quem enviou estão cargos como gerente, diretor, supervisor ou algum dos queridinhos do momento: CEO, CFO, COO etc.
O tipo de trabalho que exerço me coloca em contato com diversas empresas e o que tenho visto às vezes chega a dar medo. São “gerentes de atendimento” que não têm o menor tato com os clientes, “coordenadores de projeto” que não têm o mínimo de organização, “especialistas em comunicação” que não conseguem se fazer entender, “diretores de arte” que nunca ouviram falar em proporção áurea e por aí vai. Os cargos variam, mas a resposta quando são chamados atenção sobre coisas básicas que deveriam saber é quase sempre a mesma: “mas eu sou formado em...”.
Em vez de terem vergonha de não saberem o mínimo mesmo tendo formação, muita gente tem usado o diploma apenas para dar “carteirada” no melhor estilo “você sabe com quem está falando?”. No Brasil que queremos – e precisamos – não há mais lugar para “carteiradas” e o quanto antes nos conscientizarmos disso, mais cedo deixaremos de ser o país do futuro para sermos uma nação forte no presente.
Patricia Lages
É jornalista internacional, tendo atuado na Argentina, Inglaterra e Israel. É autora de cinco best-sellers de finanças e empreendedorismo e do blog Bolsa Blindada. Ministra cursos e palestras, tendo se apresentado no evento “Success, the only choice” na Universidade Harvard (2014). Na TV, apresenta os quadros "Economia doméstica" no programa "Mulheres" TV Gazeta e "Economia a Dois" na Escola do Amor, Record TV. No YouTube mantém o canal "Patrícia Lages - Dicas de Economia", com vídeos todas as segundas e quartas.
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