Imagine a cena: uma mulher tem o desejo de assistir um jogo de futebol ao vivo, porém, como as autoridades de seu país não permitem, ela se veste de homem e segue em direção ao estádio. Chegando lá, seu disfarce é descoberto e ela é detida pela polícia. Temendo os maus tratos na cadeia, a mulher ateia fogo em si mesma diante do tribunal onde seria julgada por seu “crime” e morre dias depois em um hospital.
Essa história não é ficção e nem aconteceu no século passado, mas sim, há menos de dois anos. Essa mulher se chamava Sahar Khodayari, tinha 29 anos e esse país é o Irã. Sim, o Irã, o mesmo país que acaba de ser eleito pela Organização das Nações Unidas (ONU) como membro da Comissão sobre o Status da Mulher, que nada mais é do que o principal órgão global para empoderar mulheres e fomentar a igualdade de gênero.
Antes da Revolução Islâmica de 1979, as mulheres iranianas viviam em pé de igualdade com o resto do mundo. Votavam, se candidatavam a cargos públicos, frequentavam universidades, restaurantes, faziam piqueniques – programas muito populares à época – e se vestiam como as mulheres ocidentais: jeans, blusas de mangas curtas e até minissaias.
Hoje, porém, elas literalmente têm de se cobrir da cabeça aos pés, mesmo sob um calor que pode passar dos 40 graus. Mostrar os cabelos é proibido, portanto, o hijab (véu islâmico) tem de ser usado por religiosas ou não, o que inclui mulheres estrangeiras. Elas também não podem viajar ou trabalhar sem que um homem (marido ou parente) autorize e são segregadas nas escolas, universidades, locais de trabalho e até nos ônibus, onde só podem viajar na parte de trás. Além disso, tudo o que está relacionado à diversão só é permitido aos homens.
No Irã, as mulheres não são apenas tratadas como se fossem inferiores, mas são consideradas inferiores por força de lei, conforme determina a sharia (lei islâmica).
Quem rege o país é seu líder religioso, que possui mandato vitalício com poderes ilimitados, incluído o de demitir o presidente, caso este não respeite as leis do Islã ou seja lá pelo motivo que for. É esse país que, a partir de 2022, fará parte do mais importante órgão de promoção dos direitos das mulheres por um período de quatro anos. A eleição do Irã causou indignação principalmente às iranianas, tanto dentro quando fora do país. Pelo menos três associações de mulheres iranianas – na França, Itália e Suécia – consideraram a escolha um “insulto”.
Essa é apenas mais uma demonstração do quanto o mundo está de cabeça para baixo. Agora, além de todos os desafios que já enfrentamos, teremos de lidar também com a nomeação de um lobo para defender o direito das ovelhas.