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Amor entre pessoas com e sem deficiência é alvo de preconceito

Conheça a história de dois casais: Marília e Manoel Gustavo; Isabele e Rennan Phillipe, que falam de afeto, família e planos futuros

Viva a Vida|Brenda Marques, do R7

Isabele e Rennan se conheceram em 2014, por um grupo de WhatsApp
Isabele e Rennan se conheceram em 2014, por um grupo de WhatsApp Isabele e Rennan se conheceram em 2014, por um grupo de WhatsApp

Marília Fonseca Miranda e Manoel Gustavo da Silva; e Isabele Caroline e Rennan Phillipe Moreira: dois casais com histórias distintas, mas que irão inspirar muitos pares neste 12 de junho, Dia dos Namorados.

A história das duplas se entrelaça em diversos pontos e já despertou muitos olhares de estranhamento vindos de espectadores que não conseguem conceber a paixão entre pessoas com diferentes condições de vida. Isso porque Marília, de 47 anos, e Isabele, de 26, são mulheres com deficiência casadas com homens sem deficiência. E, por isso, lidam dia a dia com o capacitismo, como é chamado o preconceito e a discriminação contra pessoas com deficiência.

Marília e Manoel se conheceram dentro de um ônibus, em 2004. Isabele e Renan tiveram o primeiro contato em um grupo de WhatsApp, em 2014. Marília e Manoel têm 15 anos de casados e duas filhas. Isabele e Rennan moram juntos há três anos e planejam engravidar no ano que vem.

E o enredo de seus romances também possui coincidências compartilhadas. Nos dois casos, o encontro aconteceu por causa de amigos em comum. Tanto Marília quanto Isabele são mais velhas que seus companheiros. Os quatro são nordestinos e, além disso, vivem histórias de amor reais, que seriam dignas de filme. Veja como esses casais inspiradores conseguem manter a chama acesa e superar o preconceito.

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Namoro à distância, vida a dois e futura gravidez

Isabele e Rennan, de 25 anos, começaram a conversar porque um amigo dos dois resolveu criar um grupo no WhatsApp por causa do Carnaval.

“Eu chamei ele primeiro no privado, porque ele falou que gostava de Léo Santana, e eu também sou muito fã. Aí a gente começou a se falar todos os dias”, conta Isabele.

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Durante três meses, eles se relacionaram apenas por mensagens e ligações, porque estavam cerca de 240 km separados - distância entre Natal, capital do Rio Grande do Norte, de Jardim do Seridó, cidade de Isabele, onde o casal mora atualmente. “Ele chegava da faculdade e me ligava. Teve um dia que a gente passou doze horas na ligação. Ficávamos até de manhã conversando”, lembra ela.

Mas nem tudo era chamego. Também havia outros personagens envolvidos na história, e um pouco de insegurança. “Tinha uma menina que ele ficava antes de começar a falar comigo. E quando ele falou que estava gostando de mim, eu duvidei e briguei com ele, porque a menina ficava de indireta naquele grupo do WhatsApp”, conta ela.

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Rennan disse que estava tudo acabado entre ele e a moça. Mas não adiantou. “Eu briguei, disse que não queria mais olhar na cara dele, que ele estava mentindo”, recorda Isabele. Para resolver a situação, Rennan tomou uma atitude ousada, mesmo antes de conhecer a crush.

“As pessoas começaram a me perguntar se eu estava namorando e eu sem entender, falando que não. Quando fui ver, ele tinha me assumido no Facebook. Ficou desesperado, tadinho”, relata, aos risos. Apesar de não ter sido comunicada, ela gostou da mudança de status de relacionamento nas redes sociais.

O primeiro encontro aconteceu uma semana depois, quando a jovem estudante de serviço social viajou até Natal para um simpósio da faculdade. “A gente deu um beijão lá no hospital que foi onde aconteceu a reunião”, afirma Isa. “Na outra semana, ele veio para a minha cidade e conheceu minha família”, acrescenta. Ela só pôde fazer o mesmo depois que terminou a faculdade, pois sua rotina era muito corrida.

Desafios a dois

A oficialização do relacionamento não foi a solução para todos os problemas do casal. Ao contrário, trouxe à tona outros desafios. “Eu sou muito ansiosa, se ele demorava 3 minutos para me responder e estava online, eu já brigava com ele e já bloqueava”, admite Isa. “Ele é mais tranquilo, nunca ligou muito para isso”, compara.

Mas esse foi um entrave pequeno diante dos inúmeros que já enfrentaram. O maior deles foi o preconceito da mãe de Isabele. “Eu tenho PC [paralisia cerebral] leve. E meus pais nunca tinham me visto namorando sério. Então, pegavam muito no pé dele”, recorda.

Isabele nasceu prematura - aos sete meses de gestação - e teve falta de oxigênio nos tecidos do organismo, chamada cientificamente de hipóxia. Por isso, ela tem encurtamento de tendão nas duas pernas e anda com um pé mais erguido que o outro. Também usa goteiras (talas de lona) - mas só na hora de dormir -, faz fisioterapia e já levou alguns tombos por aí, mas nada que a impedisse de sair com as amigas, curtir festas e beijar na boca.

Entretanto, sob olhares capacitistas, pessoas com deficiência não são aptas para uma vida plena e nem dignas de amor. “Quando minha mãe soube, foi um choque para ela, apesar de saber que eu ficava com outros meninos. Ela até chorou no dia”, recorda. “As pessoas achavam que ele estava comigo por interesse. Falavam que ele só me queria por dinheiro. Mas nem dinheiro eu tinha”, acrescenta.

A falta de apoio e, mais do que isso, o desejo da mãe de que o namoro acabasse, provocou o afastamento de Isabele. “Passei um bom tempo sem falar com ela. Comprei tudo [para a casa nova] e fui embora. Na época, ela chorou muito, ficou desesperada. Mas ter meu cantinho é muito bom”, comemora.

Pizza, séries e festas

Isabele e Rennan são um casal eclético quando o assunto é lazer. Eles gostam muito de comer lanches, pizza e ver série juntos. Mas também não dispensavam uma festa antes da pandemia.

“Em festa tem aqueles olhares e eu sou bem nojenta, olho com a mesma cara para a pessoa. E tem gente que vê nós dois andando na rua e pensa que eu sou irmã dele. Nunca me veem como mulher dele”, destaca. “Mas hoje em dia sou mais resolvida com isso, porque me aceito bem”, reflete.

Os próximo plano do casal é aumentar a família no ano que vem. “Ontem, no neurologista, a gente já perguntou dessa possibilidade [de ter filho]. Eu quero ter só um, porque acredito que a maternidade, para a gente, é um pouco mais complicada”, pondera Isa.

Da balada à calmaria em família

Marília e Manoel Gustavo com as filhas, Lua e Mel
Marília e Manoel Gustavo com as filhas, Lua e Mel Marília e Manoel Gustavo com as filhas, Lua e Mel

Era dia 21 de março de 2004 quando Marília e Manoel Gustavo se conheceram. “Foi presente de aniversário”, diz ele, que completava 20 anos naquela data. Os dois se trombaram em um ônibus, enquanto ele ia para a balada com uma amiga que tinham em comum, e ela voltava do trabalho.

Começaram a conversar. O papo foi tão bom que Marília mudou seus planos e resolveu sair com eles. Após a noitada, seguiram tendo contato um com o outro, graças a essa amiga em comum. Um mês depois, aconteceu o primeiro beijo e demorou mais um ano e meio até o namoro virar casamento.

“Somos muito cúmplices de vida”, descreve Marília. E aí já vieram os rebentos - o casal tem duas filhas: Lua, de 13 anos, e Mel, de 10.

Durante a primeira gestação, Marília teve seu primeiro descolamento de retina e o mundo ao seu redor começou a se tornar uma mancha que a cada dia ficava mais opaca. Até que, depois de dar à luz sua filha caçula, ela perdeu a visão do olho esquerdo e passou a enxergar apenas vultos com o direito.

“A minha deficiência nos uniu ainda mais. Eu sempre achei que eu era a resolução de todos os problemas. Eu era a pessoa que fazia tudo, ia em banco, em mercado. E aí, quando veio a limitação, eu acabei tendo que combinar tudo com ele”, conta.

“Aqui é tudo dividido, ninguém escapa não. No dia que dá pra um fazer, vai lá e faz, e vice-versa”, resume Gustavo.

Superando as dificuldades

Para aprender a lidar com a nova condição de vida, Marília procurou ajuda profissional e começou a fazer terapia em grupo. Mas seu maior alicerce foi Gustavo.

“Na época, eu achei muito fofa uma coisa que ele me disse: ‘Amor, você está aprendendo a usar bengala, mas a gente vai estar junto para sempre’. E quando você se torna PCD [pessoa com deficiência], dá uma insegurança. Então, ter uma pessoa que te dê apoio, que não te olhe com pena, é de suma importância”, afirma. “Mas fácil não é. É uma construção diária”, define.

Marília tem cegueira noturna e, por isso, anda com o auxílio de bengalas quando sai de casa à noite ou está sozinha em locais públicos.

Ela relata uma situação de preconceito que viveu enquanto estava na folia com Gustavo. “Os olhares são sempre os piores. Um dia a gente estava num bloco de Carnaval e aí veio uma amiga de longa data e disse: ‘Ah, você aqui?’ E eu respondi: ‘e por que não?’. Mas aí o Gustavo interveio, me tirou de perto dela e seguimos o baile”, lembra.

Há quatro anos, a família se mudou de Natal, no Rio Grande do Norte, para a cidade de Marechal Deodoro, em Alagoas, a fim de ter mais qualidade de vida.

“Aqui tem a Praia do Francês e as meninas ficam andando de patins no calçadão, enquanto eu e o Gustavo tomamos cerveja. Tem também passeios de barco que eu amo fazer”, afirma. “Em Natal não tinha nada disso, era uma cidade concreta”, compara.

Para quem não acredita no amor entre pessoas com e sem deficiência, ela deixa um recado. “Tire as vendas dos seus olhos, que cego é´você. Para tudo que a gente pode ter de interrogação, a resposta é amar”.

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