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Análise: 86% dos moradores das favelas passarão fome

Enquanto o movimento “fique em casa” cresce impulsionado por pessoas com renda garantida e geladeira cheia, os índices de fome e os riscos de morte dos mais pobres aumentam a cada dia

Patricia Lages|Do R7

Moradores da favela Paraisópolis, em São Paulo, aguardam doações em meio à quarentena
Moradores da favela Paraisópolis, em São Paulo, aguardam doações em meio à quarentena Moradores da favela Paraisópolis, em São Paulo, aguardam doações em meio à quarentena

Os dados das pesquisas do Data Favela e do Instituto Locomotiva são tão ou mais alarmantes do que os índices de infectados e mortos por coronavírus. Não está em discussão o fato de que a covid-19 precisa de atenção e providências, isso está claro e é uma realidade, mas a vida e a morte das pessoas não se resumem apenas a ele.

Segundo levantamentos, a quarentena já impactou a vida de 97% dos 13,6 milhões de moradores das favelas de todo Brasil. Sete em cada dez famílias tiveram diminuição da renda nas últimas semanas devido à quarentena. Porém, o fato de não poderem sair para trabalhar não significa que estejam em confinamento e muito menos em segurança. Apenas uma minoria tem carteira assinada e pode ficar em casa sem prejuízo de sua renda.

Mas a dura realidade das favelas é de pessoas que normalmente vivem agrupadas e com pouco ou nenhum acesso a saneamento básico. Para estes não basta dizer “lave as mãos”, mas é preciso também indicar onde fazer isso. Nesse contexto, falar sobre o uso do álcool em gel me parece totalmente dispensável.

Sem emprego formal, a maioria dos moradores empreende por conta própria e vive um dia de cada vez. As pesquisas apontam que, se essas pessoas permanecerem sem trabalhar por um mês, 86% delas terão dificuldades para comprar comida e outros itens básicos de sobrevivência. Embora haja quem justifique a propagação do “fique em casa” dizendo que a saúde vem em primeiro lugar e que as perdas materiais devem ficar em segundo plano, o que dizer a quem já vive com a saúde em risco o tempo todo e que materialmente possui muito menos do que precisa para viver dignamente?

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Quando nos referimos aos moradores das favelas, devemos lembrar que estamos falando de cerca de 6,5% da população brasileira que movimenta R$ 119,8 bilhões por ano. Esse é um volume de dinheiro maior do que o PIB de 19 dos 27 estados brasileiros. E qual é o retorno que eles têm? Quanto vale a vida deles? Ou, usando a perguntinha da moda: quantos moradores de favelas precisam morrer para que as pessoas entendam que apenas ficar em casa não resolve?

A impressão que se tem é que não existe mais nenhum problema além da pandemia. Parece que ninguém mais morre por falta de sangue, pois embora os hemocentros estejam com os estoques baixos por falta de doadores, quase não se ouve falar disso. Parece que ninguém mais precisa de tratamento médico, que não há mais dengue nem tuberculose e que o acompanhamento a diabéticos, hipertensos e de pessoas com câncer pode esperar tudo isso passar. O coronavírus pode causar mortes muito além de suas vítimas diretas e ficar em casa de braços cruzados publicando textões para ganhar likes, frases de efeito e hashtags da moda não vai diminuir o problema.

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Patricia Lages

É jornalista internacional, tendo atuado na Argentina, Inglaterra e Israel. É autora de cinco best-sellers de finanças e empreendedorismo e do blog Bolsa Blindada. Ministra cursos e palestras, tendo se apresentado no evento “Success, the only choice” na Universidade Harvard (2014). Na TV, apresenta o quadro "Economia a Dois" na Escola do Amor, Record TV. No YouTube mantém o canal "Patricia Lages - Dicas de Economia", com vídeos todas as terças e quintas.

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